O número de miseráveis reconhecidos em cadastro pelo governo
subiria de zero para ao menos 22,3 milhões caso a renda usada oficialmente para
definir a indigência fosse corrigida pela inflação.
É o que revelam dados produzidos pelo Ministério do Desenvolvimento
Social, a pedido da Folha, com base no Cadastro Único, que reúne informações de
mais de 71 milhões de beneficiários de programas sociais.
Desde ao menos junho de 2011 o governo usa o valor de R$ 70 como
"linha de miséria" --ganho mensal per capita abaixo do qual a pessoa
é considerada extremamente pobre.
Ele foi estabelecido, com base em recomendação do Banco Mundial,
como principal parâmetro da iniciativa de Dilma para cumprir sua maior promessa
de campanha: erradicar a miséria no país até o ano que vem, quando tentará a
reeleição.
Mesmo criticada à época por ser baixa, a linha nunca foi
reajustada, apesar do aumento da inflação. Desde o estabelecimento por Dilma da
linha até março deste ano, os preços subiram em média 10,8% --2,5% só em 2013,
de acordo com o índice de inflação oficial, o IPCA.
Corrigidos, os R$ 70 de junho de 2011 equivalem a R$ 77,56 hoje.
No Cadastro Único, 22,3 milhões de pessoas, mesmo somando seus ganhos pessoais
e as transferências do Estado (como o Bolsa Família), têm menos do que esse
valor à disposição a cada mês, calculou o governo após pedido da Folha por meio
da Lei de Acesso à Informação.
Esse número corresponde a mais de 10% da população brasileira e é
praticamente a mesma quantidade de pessoas que tinham menos de R$ 70 mensais
antes de Dilma se tornar presidente e que ela, com seis mudanças no Bolsa
Família, fez com que ganhassem acima desse valor.
Os dados possibilitam outras duas conclusões. Primeiro, que um
reajuste da linha anularia todo o esforço feito pelo governo até aqui para cumprir
sua promessa, do ponto de vista monetário.
Segundo, que os "resgatados" da miséria que ganhavam no
limiar de R$ 70 obtiveram, na quase totalidade, no máximo R$ 7,5 a mais por mês
--e mesmo assim foram considerados fora da extrema pobreza.
Além do problema do reajuste, o próprio governo estima haver cerca
de 700 mil famílias vivendo abaixo da linha da miséria e que estão hoje fora
dos cadastros oficiais.
A reportagem pediu outra simulação ao governo, usando agosto de
2009 como o início do estabelecimento da linha de R$ 70. Nessa época, um
decreto determinara o valor para definir miséria no Bolsa Família.
Nesse outro cenário (inflação acumulada de 23,4%), o número de
extremamente pobres seria ainda maior: 27,3 milhões de pessoas. A data marcou a
adoção do valor no Bolsa Família, mas não em outros programas, diz o governo.
Cf. Folha de Sao Paulo (http://www1.folha.uol.com.br/poder/2013/05/1281132-indicador-defasado-esconde-22-milhoes-de-miseraveis-do-pais.shtml)
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